quinta-feira, 24 de abril de 2008

A Brief History of Histórias em Quadrinhos

Nesse assunto, não existe nada como os clássicos. As histórias em quadrinhos atingiram a maioridade no final dos anos ‘30, como coisa bem feita, profissional e sólida. Claro que o conceito começou muito antes disso.

Quem gosta de história clássica, como eu, vai lembrar que a famosa Tapeçaria de Bayeux, bordada, creio, no século XI, era na realidade uma história em quadrinhos, com figuras e textos, descrevendo a Batalha de Hastings, estendendo-se por 70 metros, com meio metro de altura, e narra a saga do Rei Haroldo em um capítulo decisivo na história da Inglaterra, documento essencial descrito por Winston Churchill em sua “History of the English Speaking Peoples”. Pode ser encontrada inteira, completa em desenho e textos na Internet. Também aquela Via Sacra que os fiéis fazem nas igrejas durante a Semana Santa lembra muito uma historinha em quadrinhos, figuras e legendas.

Meu primeiro contato com as histórias em quadrinhos foi quando eu tinha 7 ou 8 anos de idade e fazia tudo para minha mãe comprar as publicações, isso em 1937 ou 1938. “O Globo Juvenil” era a melhor, que tinha os quadrinhos de Mandrake o Mágico com o gigante Lothar e a princesa Marna, Brucutu na terra de Mu, a fantástica página do Príncipe Valente, desenhada por Hal Foster, cada quadro uma verdadeira pintura, das aventuras em Camelot e a princesa Alida.

Tudo era então ainda em preto e branco.

A outra revista era o “Suplemento Juvenil”, dos Diários Associados de Assis Chateaubriand, também muito boa. E havia ainda o “Tico Tico”, esta com muitas histórias brasileiras, como Zé Macaco e Faustina e Tico Tico e Bolão, Zé Pretinho, e a tira alemã dos sobrinhos do Capitão,

As duas primeiras eram impressas em formato de jornal, com páginas grandes, bem maiores até do que as dos jornais de hoje.

Havia também a página do Fantasma Voador, com seu sidekick o cachorro Capeto. Os bandidos acreditavam que o Fantasma e Capeto eram imortais, porque o personagem passava de pai para filho e moravam escondidos por uma tribo de pigmeus na África.

Meu interesse por ficção científica nasceu também nessa época, por causa dos quadrinhos de Buck Rogers, que mostrava espaçonaves, roupas espaciais e um motor a jato portátil nas costas do mocinho. Outra história de ficção científica era a do Flash Gordon, desenhada por Alex Raymond, também com altíssima qualidade, depois virou filme estrelado pelo campeão olímpico de natação Larry (Buster) Crabble. Brucutu, com seu dinossauro Dino e seu amigo Fuzzy, viviam na pré-história mas havia uma máquina do tempo que os levava a outras épocas. Foi assim que fiquei conhecendo as coisas da pré-história, a mitologia grega e a guerra de Tróia, o que muito me serviu mais tarde nas aulas de história da civilização na escola.

Havia o Popeye, nos originais de Oscar Segal e o engraçadíssimo Li’l Abner, desenhado por Al Capp, que passava-se em Brejo Seco, ele com sua mãe Chulipa e a namorada Daisy Mae, com as histórias do Dia de Maria Cebola, quando as moças podiam caçar maridos a força. A série foi depois chamada de Ferdinando e perdeu completamente a graça, acho que foi após a morte do autor original..

Lá pelos anos 40 apareceu uma versão melhorada do Globo Juvenil, em tamanho tablóide, chamada “Gibi”. Devido ao formato bem mais prático, pegou com facilidade e dominou o mercado, até emprestando o nome para toda uma classe de publicações desenhadas. “Gibi” hoje é nome genérico.

As aventuras mais exóticas eram as de “Terry e os Piratas”, que acho que eram ilustradas por Austin Briggs, que também desenhava as do detetive Nick Carter. Os desenhos eram perfeitos com grandes efeitos de luz que deixavam em branco partes da figura, que eram completadas pelo nosso cérebro. Havia um veículo submarino e roupas de mergulho, coisas nem sonhadas na época. As histórias de Tarzan também eram sucesso. Mas a segunda guerra mundial chegou e mudou o clima, transformando todo mundo em invencível herói americano, com grande perda de qualidade nas histórias e nas artes.

Ah! E o maior de todos. Superman, o Homem de Aço de Jerry Siegel. Criado em 1933, e depois firmado na revista Action Comics. Tive o previlégio, 50 anos mais tarde, de participar das campanhas comemorativas do meio século do personagem nos Estados Unidos, quando eu trabalhava como consultor internacional de relações públicas da agência de propaganda Ogilvy & Mather, onde também tivemos a conta do centenário da Ponte do Brooklin. Superman foi uma revolução nas histórias em quadrinhos, um conceito do herói com poderes excepcionais, seu nascimento e fuga do planeta Krypton,

Lembro-me bem que eu e meu irmão quase brigávamos pela vantagem de ler primeiro a revista que comprávamos a cada semana.

Quebrado o encanto da idéia nova do super-herói, vieram depois o Tocha Humana, Batman, Homem Aranha, Capitão Marvel contra o Dr. Silvana e uma série de figuras menores, todas imitações inferiores do Superman. Faço uma exceção apenas para a Mulher Maravilha, não pelos quadrinhos, que também eram sobre aquelas histórias de que o mundo está errado e os Estados Unidos estão certos, mas pela figura deliciosa de Linda Carter que foi a protagonista do papel na televisão e era minha paixão de juventude.

Os super-heróis hoje são tantos que formam um verdadeiro freak-show de esquisitices, distorções e monstruosidades -- abrutalhados e com critérios duvidosos de justiça e de ética.

A qualidade de impressão das revistas melhorou à perfeição, alguns desenhistas são realmente grandes artistas, com domínio de composição, movimento e ação que superam os dos grandes pintores ou diretores de cinema. Mas as histórias, para mim, não têm o encanto de ontem, são meramente uma extensão das mesmas coisas que vemos na TV, repetidas, obedecendo ao que as pesquisas indicam ser do gosto popular.

Quem quiser conferir o que era criatividade e entusiasmo, veja aqueles álbuns de quadrinhos pioneiros de 80 anos atrás.

terça-feira, 15 de abril de 2008

Angela Lansbury e Dorian Gray

Foi inspirado em uma noveleta de Oscar Wilde “O Retrato de Dorian Gray” que eu escrevi um conto aos 17 anos para a “Gazeta Juvenil” e ganhei 300 mil réis, meu primeiro pagamento por um texto. Não consigo lembrar se eu li o conto primeiro ou se foi o filme que eu vi antes. Mas o filme certamente foi o que mais me impressionou.
Dorian Gray era Richard Hurdnut, que nunca vi em outro filme. O filósofo mau conselheiro era o cínico George Sanders, cínico mesmo na vida real. Suicidou-se.
A cena maior, para um adolescente romântico, era a da taverna de subúrbio onde Ângela Lansbury cantava “Good Bye Little Yellow Bird”, com a carinha mais inocente e virginal do mundo, no papel da infeliz Sybil Vane. A voz é dela mesmo.
(Hoje mesmo revi este trecho, que pode ser encontrado facilmente no YouTube, mas também aqui, com a qualidade preto e branco de 1945, em

http://video.aol.com/video-detail/angela-lansbury-goodbye-little-yellow-bird/3275026730

Foi o primeiro filme de Ângela Lansbury que também devia ter uns 17 anos. Ficou no cinema até hoje, chegando a fazer papéis importantes, inclusive de cantora, mas nunca excepcionais. Ainda hoje pode ser vista nos late shows, atuando, bem mais robusta, como a escritora-detetive na série sem graça “Murder, She Wrote”, que no Brasil chama-se “Assassinato Por Escrito”.

A cena mais dramática do filme, para mim, era aquela em que Dorian Gray tocava o Prelúdio 24, opus 40 de Chopin quando, em sua mansão, tentava seduzir a menina. Ela vai embora humilhada e desapontada mas quando, já na rua, ouve ao longe o apelo da música, volta correndo para sua desgraça. Sempre ouço esse prelúdio e a imagem da cena sempre também volta... e minha vontade de gritar para ela "Vai pra casa, boba!".

domingo, 6 de abril de 2008

O Blog de Clarice Lispector

Encontrei, empoeirado em uma prateleira da estante, um livro de Clarice Lispector, um pesado volume de 780 páginas. Lembrei-me que nunca o li inteiro.
Chama-se “A Descoberta do Mundo” e se não fosse coisa do tempo da máquina de escrever, poderia muito bem passar hoje por um blog, desses em que as matérias acumulam, crescem, evoluem e adquirem arquitetura sólida e bem maior do que a soma de seus pedaços.
São crônicas e outras matérias, que ela escrevia para o Jornal do Brasil desde os anos ‘70, entrevistas, contos, noveletas e pensamentos soltos, observações do cotidiano das ruas, de sua casa, seus filhos, coisas universais e coisas pessoais, até às vezes quase íntimas.
Ela dizia que “escrever é uma maldição” mas nunca acreditei que sentisse isso de verdade. Uma de suas pequenas mensagens é um pedido aos linotipistas, para que não corrijam o que ela escrever: “A pontuação é a respiração da frase, e minha frase respira assim”.
Era capaz de fazer cada leitor reviver emocionalmente suas experiências como se fosse ela mesma, e isso é a essência da arte. Cada texto dela é uma aula de redação.
Vou procurar um espanador e ver se consigo encontrar mais algum livro dela perdido na desorganização de minhas prateleiras. É uma benção ter uma memória que esquece certas coisas, e permite assim que a gente as descubra de novo e volte a saborear mais uma vez o prazer de ler um texto bom.

sábado, 29 de março de 2008

Sobre aqueles 4.000 Americanos - Vitória

Em um velho livro de poemas inglêses procurei estes versos de Robert Southey escritos no fim do século 18. Descrevem muito bem o que sinto quando leio que o número de mortos americanos no Iraque passou dos 4.000, além obviamente das centenas de milhares de civis iraquianos, velhos, mulheres e crianças (mas estes obviamente não contam, são meramente danos colaterais). Daqui há alguns anos alguma criança fará estas perguntas e terá estas respostas.

Robert Southey (1774-1843)

The Battle of Blenheim

It was a summer evening;
Old Kaspar’s work was done,
And he before his cottage door
Was sitting in the sun;

And by him sported on the green
His little grandchild Wilhelmine.

She saw her brother Peterkin
Roll something large and round,
Which he beside the rivulet
In playing there had found.
He came to ask what he had found,
That was so large, and smooth, and round.

Old Kaspar took it from the boy,
Who stood expectant by;
And then the old man shook his head,
And with a natural sigh,
“‘Tis some poor fellow’s skull,” said he,
“Who fell in the great victory.

“I find them in the garden,
For there’s many here about;
And often, when I go to plow,
The plowshare turns them out;
For many thousand men,” said he,
“Were slain in that great victory.”

“Now tell us what ‘twas all about,”
Young Peterkin, he cries;
And little Wilhelmine looks up
With wonder-waiting eyes;
“Now tell us all about the war,
And what they fought each other for.”

“It was the English,” Kaspar cried,
“Who put the French to rout;
But what they fought each other for,
I could not well make out;
But everybody said,” quoth he,
“That ‘twas a famous victory.

“My father lived at Blenheim then,
Yon little stream hard by;
They burnt his dwelling to the ground,
And he was forced to fly;
So with his wife and child he fled,
Nor had he where to rest his head.

“With fire and sword the country round
Was wasted far and wide,
And many a childing mother then,
And new-born baby, died;
But things like that, you know, must be
At every famous victory.

“They say it was a shocking sight
After the field was won;
For many thousand bodies here
Lay rotting in the sun;
But things like that, you know, must be
After a famous victory.

“Great praise the Duke of Marlboro’ won,
And our good Prince Eugene.”
“Why, ‘twas a very wicked thing!”
Said little Wilhelmine.
“Nay, nay, my little girl,” quoth he;
“It was a famous victory.

“And everybody praised the Duke
Who this great fight did win.”
“But what good came of it at last?”
Quoth little Peterkin.
“Why, that I cannot tell,” said he;
“But ‘twas a famous victory.”

domingo, 16 de março de 2008

Medidas Extremas

Para quem cursou o colegial nos anos ‘50 -- quando ainda se aprendia Shakespeare, Marlowe e Rabelais, história antiga, geografia econômica e matemática de limites e derivadas -- que preparava o caminho para o cálculo integral e diferencial, o nível das escolas e hoje é de apavorar. Os jovens que cursam agora o terceiro colegial, mesmo após 11 anos de estudos, não são capazes de fazer uma conta de dividir, ou mesmo multiplicar, e riem se alguém falar em PI ou em raiz quadrada. É até provável que seus professores também não saibam. Todos dependem das calculadoras.

Como a cada dia tudo passa a exigir mais precisões micrométricas, será muito difícil para esses jovens entenderem o conceito das dimensões grandes ou pequenas demais.

A precisão nas medidas sempre foi uma função da necessidade de cada época. Para se plantar e colher no século 9 a.c. bastava lembrar as datas aproximadas dos solstícios e estações do ano. Para se construir na época de Tales de Mileto, um número PI com o valor de 3 era suficiente para todas as necessidades.

Arquimedes, em 200 a.c. aprimorou o que Euclides inventou e sua matemática não mudou durante os dois milênios que o seguiram. Ele também calculou o número PI, em uma época em que não existiam os algarismos decimais de hoje, nem o zero. E determinou o seu valor (entre 223/71 e 220/70) correto até o equivalente a duas decimais, o que é ainda usado praticamente em quase tudo que calculamos hoje, ou seja, com um erro possível de apenas milímetro por metro.

Mas isso foi antes da tecnologia chegar às miniaturizações extremas que hoje se usam, ou aos números gigantescos necessários para calcular quantidades de partículas ou distâncias cósmicas. Existem até números especiais para esses cálculos, embora apenas teóricos. O “googol”, que vale 10 elevado à potência 100, e o “googolplex” que é tudo isso elevado de novo à potência 100. Mas mesmo um simples googol já seria suficiente para contar o número de partículas subatômicas de todo o universo.

A matemática dos números super-grandes e super-pequenos trabalha apenas com ordens de grandeza, pois não há espaço para valores exatos. Assim, o tamanho do “universo observável” é de 10^26 metros, ou seja 10 seguido de 26 zeros. Um inseto teria uns 10^-2 metros, algo como 3 milímetros. E o menor número significativo como medida, na natureza, seria 10^35 metros, ou seja, o número 1 precedido de um zero-vírgula e mais 35 zeros. Não me perguntem por que, achei no Scientific American (Nov 2007, pg.31).

Os engenheiros, práticos como têm que ser, desprezam valores sem significado útil. Afinal, se a gente está construindo uma parede de 10 metros, qual é o problema de haver alguns milímetros a mais ou a menos, que podem depois ser acertados na argamassa. Ou meia dúzia de decimais já são suficientes para fazer com que a cápsula espacial entre com precisão na órbita de Marte. Os matemáticos pensam diferente e continuam calculando o número PI com até dois bilhões de decimais e esperam que se construam computadores mais potentes, para ver se algum dia encontram algum padrão de repetição ou finalização que prove que números como PI e “e” sejam exatos ou dízimas periódicas.

Quantos estudantes de hoje chegarão a se interessar por assuntos como esses?

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

O Voto da Rainha

A democracia da Grécia de Péricles é louvada até hoje como o começo da justiça política, através do voto. Mas pouca gente leva em conta que esse voto era tudo, menos popular. Democracia, mas só da elite. Só votavam os homens nascidos livres, proprietários de terras, cidadãos, pois as mulheres não tinham esse direito, por mais ricas e cultas que fossem, nem os jovens.
Nem os escravos, embora grande parte dos artistas, professores, escribas, contadores, cirurgiões, pudessem ser escravos, domésticos ou pertencentes à própria cidade.
Os reais eleitores eram portanto a elite dos patrícios, cidadãos e nobres, provavelmente pouco menos de 20% de todos os habitantes.
Encorajava-se a que fossem votados os mais ricos, donos de terra, e os mais cultos, por se achar que seriam mais competentes para governar. Os demais cargos eram preenchidos por uma loteria entre todos os cidadãos, cerca de 6.000 no caso de Atenas.
Os detentores desses cargos tinham total responsabilidade e podiam ser punidos por suas falhas. No caso dos militares, fracassos poderiam significar até pena de morte,
Aos demais, sobrava a pena do ostracismo, quando os eleitores escreviam o nome do “candidato” em uma casca de ostra. Se a quantidade fosse suficiente, ele era banido da cidade por um período de 10 anos.
Algumas dessas idéias resolveriam certos problemas nossos hoje.
Um dos sistemas eleitorais mais inteligentes, que muito me impressionou, foi o inventado no livro “In the Wet”, pelo escritor australiano Nevil Shute -- aquele que também escreveu a novela post-apocalíptica da morte vagarosa de todos os habitantes do mundo depois de uma hecatombe nuclear, começando pelo hemisfério norte e pouco a pouco se espalhando por toda a terra ("On The Beach").
Ele concebe um tipo de valor para o eleitor, que varia à medida que sua importância como cidadão aumenta.
Dessa forma um eleitor pode ter o valor de seu voto acrescido em seu valor, até 7 vezes mais do que o voto básico tradicional.
Cada cidadão que completasse 21 anos seria de imediato considerado um eleitor, pois com menos idade do que isso não se pode confiar na seriedade e discernimento para decisões tão importantes. Esse é o nível 1, o primeiro voto ou Voto Base.
O nível 2 é o Voto da Educação. É outorgado a qualquer pessoa formada em um curso superior, ou que atinja o oficialato, se for militar. É o reconhecimento ao esforço intelectual e à provável melhor competência em seu critério de julgamento.
O eleitor pode somar também ao seu título o Voto de Viagens ao Estrangeiro, ou nível 3, para quem tenha sido capaz de viver por mais de dois anos em um país diferente e trabalhar e se sustentar por sua própria conta.
O Voto Família é o quarto, e iria para cada um dos membros do casal que conseguisse criar pelo menos dois filhos até os 14 anos de idade, sem se divorciar. Transmite uma idéia de segurança, seriedade e estabilidade.
O nível 5 é o Voto de Realização, que é prerrogativa de quem construiu alguma coisa importante para sí próprio, para o Estado ou para outros. É dado a um industrial ou comerciante de sucesso, um profissional liberal de destaque. Algo para ser concedido a um Pitanguí, Antônio Ermírio ou Niemeyer. É simplesmente o reconhecimento à capacidade prática e realizadora da pessoa. Obviamente um presidente de empresa deverá ter melhor critério de julgamento do que a faxineira de seu escritório. Poderia ser dado a qualquer pessoa que fosse capaz de ganhar mais de 100.000 reais por ano... no ano anterior à eleição.
O nível 6 é o Voto da Religião, e é o único do qual eu discordei, pois até me surpreende a idéia vir do Nevil Shute, um ateu, engenheiro aeronáutico, ex-militar e materialista, escritor de “techno-thrillers”. Esse voto seria concedido a pessoas que de destacassem no âmbito espiritual, como líderes religiosos. Em minha opinião, acho que seria o ideal para os Bispos Macedos da vida, e seus outros bispos, pastores faladores, padres marcelos, milagreiros e curadores espíritas.
O último é o nível 7, que seria raríssimo, talvez apenas uma meia dúzia por ano, que o autor chama de Voto da Rainha, seria dado por Sua Majestade Real Britânica a quem ela julgasse que merece, por sua escolha arbitrária, sem necessidade de nenhum critério específico. Na realidade, seria uma condecoração ou honraria. Mas é necessário lembrar que “In the Wet” foi escrito nos anos 60 e a importância da Rainha era outra e a Austrália ainda era parte atuante do Commonwealth.
É claro que tal sistema é uma idéia que jamais será considerada, mas não se pode deixar de pensar que algo parecido com isso poderia dinamizar muito mais o processo eleitoral, provocando maior interesse pela política entre aqueles que estudam, lêem jornais e estão atentos às mudanças do mundo e ao caráter dos políticos de seu país. Seria reconfortante saber que o seu voto vai pesar mais porque sua opinião é respeitada como mais ponderada, pela comunidade.

domingo, 25 de novembro de 2007

"Domingo Triste" - a canção do suicídio

Quando Goethe publicou seu "Werther", provocou na Europa uma onda de suicídios, de gente que se identificava com a saída única encontrada para um grande amor não correspondido.
Menos conhecida é a história da canção húngara "Szomorú Vasarnáp", ("Gloomy Sunday", ou "Domingo Triste") escrita por Rezsö Seress lá por volta de 1925.
As editoras de músicas se recusavam a publicá-la, por ser triste e trágica de mais, tanto na letra como, principalmente, na melodia. Seress suicidou-se, sua mulher também e dizem que mais de uma centena de suicídios ocorreram tendo como causa direta o desespero dessa melodia. Casos como de uma secretária que foi encontrada envenenada, tendo nas mãos uma cópia da partitura. Durante a ocupação nazista de Budapest, foi proibida por ser o hino da tristeza causada pela repressão à alma húngara.
Como toda obra inspirada, a maioria das versões que encontramos hoje são "pioramentos" sobre a canção original, tanto na letra como na música. Há até uma versão bonita cantada por Billie Holiday e outra pela estrela do "Fantasma da Ópera". Mas nenhuma delas transmite e beleza trágica da arte do original de Seress.
Como eu, você não deve entender uma palavra de húngaro. Mas desafio a ouvir a versão cantada por Poká Angéla, acompanhada apenas por uma flauta em baixo registro. Asseguro que sentirá uma tristeza que aperta o coração e faz nascer lágrimas nos olhos. Bastam a música e a interpretação da artista. (clique no primeiro endereço abaixo. DICA: se o seu computador estiver vagaroso, acione a Pausa e espere que o YouTube baixe pelo menos metade da música, antes de ligar o Play, para evitar que a melodia fique entrecortada... )
O tema é a ausência de amor. Não de "um certo amor", mas a não existência de amor. Em certos versos, a tristeza vem das desgraças do dia a dia, guerras, mortes, um sofrimento que parece não ter remédio. Em outros, um poema chama alguém para que a veja morta na igreja, entre muitas flores, crepes, padres e cantos, e onde ela o espera de olhos abertos para vê-lo mais uma vez, mas não há nenhum lamento nem queixa, só muita tristeza. Tétricas e pungentes ambas as letras... Para sentir esta canção é preciso entrar nela, aceitá-la, re-viver o que seu autor viveu.
Anotei três endereços no YouTube onde as versões são mais próximas do original. Se o dia estiver como este domingo hoje (25/11/07), cuidado para não sucumbir à sugestão da tragédia. Mas a beleza vale o risco.
As outras versões têm menor qualidade, mas são mais autênticas, pois usam a partitura original do piano e do violino.
Endereços:
http://www.youtube.com/watch?v=LZZlvHPO2T4&feature=related
http://www.youtube.com/watch?v=HAzJ_7CeWbc&feature=related
http://www.youtube.com/watch?v=TiOyvxgcob4&feature=related